sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Do novo eu



Em algum momento da vida,
num momento inexato,
perde-se no esmo dos dias o antigo eu,
então nasce o novo eu.
O novo eu têm consciência de que o antigo
agora encontra-se enterrado,
sob sete palmos de fatos,
inegáveis, irreparáveis, transitórios e perenes.


*Diálogo:

Custou á Zará o pensador, encontrar o túmulo no qual se encontrava seu antigo eu, com uma pá - que continha gravada em seu cabo "loucura, retrocesso, " - ele cavucou com furor a terra, até que a pá atingiu algo sólido, era um caixão, Zará tentou, mas não obteve êxito em retirá-lo do fundo da cova devido ao demasiado peso, então com a ponta da pá abriu-o ali mesmo, sem retirá-lo no fundo, lá dentro encontrava-se seu antigo eu, que, com a luz do sol em seus olhos rogou e praguejou, para que se fechasse a tampa e que se enterra-se novamente o caixão.


_Por que fazes isso? Quem veio á me desenterrar? - perguntou o antigo Zará, ainda deitado no caixão aberto, tapando os olhos com as mãos.
_O que te colocara nesse caixão? E por que enterrara-te? Quem lhe fala é você mesmo, é o novo Zará - havia uma ansiedade e ânimo ativo no tom do novo Zará.
_Suma daqui, enterre-me novamente.
_Não, antes preciso obter as respostas.
_Está bem - então sentou-se ali dentro do caixão mesmo, com as pernas cruzadas, e continuou - houve um momento em que eu possuía.
_Possuía o que?
_O que eu mais almejava, minha máxima aspiração, encontrava-se sólida em minhas mãos - os olhos do antigo Zará abriam-se lentamente, estavam fechados á anos e logo, mal acostumados á claridade - eis que ela, a minha máxima aspiração escorreu das minhas mãos, de modo que eu não mais exercia minha pretensão sob ela, o ente inerte e impassível, intransmutável, tornou-se então inatingível, incontrolável, nada que era do meu alcance, poderia alcançar o ente genuíno.
_Mas, e então? - perguntou o novo Zará, extasiado.
_Eis que o ente tornou-se maior que meu eu, e numa reviravolta, fui eu quem me tornei alcançável pelo ente, mas o ente, era para mim inalcançável, então eu fui "engolido" por ela.
_Que terrível - esbravejou o novo Zará.
_Então, juntos caminhamos até aqui neste monte inóspito, eu e o ente, que gentilmente ensinou-me o ofício do lenhador, eu o aprendi bem, depois, deu-me as coordenadas de como construir um caixão, e partiu para uma viagem, eu assim o fiz. Tempos depois o ente retornou da viagem e me deu uma pá, para que cavasse esta cova no chão, eu assim o fiz, e gentilmente segui os passos emanados da voz límpida e perfeita do ente redentor, gentilmente ele ajudou-me e enterrou-me, e agora, você veio á desenterrar-me, mas veja bem, enterre-me de volta agora que já tens tua resposta, eu e você somos como a matéria e a antimatéria, combinados, destruiríamos á nós mesmos.
_Entendo, é estranho contemplar isso, o ente perante á mim, permanece inalcançável, e o mesmo acontece quando se trata de mim, perante o ente - concluiu o novo Zará.


Zará então fechou o caixão e pôs a terra de volta em seu devido lugar, contemplou que o ente nada mais é do que um fator benéfico, que solidifica o eu, destruindo o velho para fazer nascer o novo, este, ao contrário do velho, tratará com rigor o ente, e não deixará que uma gentileza de fazer arrepiar os pelos o conduza ao próprio enterro.





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Aprender a não existir

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